Oito dias depois de ter liberado as primeiras emendas
parlamentares individuais do ano, o governo Jair Bolsonaro anulou mais da
metade dos empenhos de gastos indicados por deputados e senadores alegando
contingenciamento de recursos. A medida atinge as indicações do próprio
presidente, que havia sido o maior beneficiado pelas liberações, com 30% do
valor total autorizado até o início deste mês.
Dados do Portal da Transparência, do governo federal,
mostravam até o dia 2 de abril que Bolsonaro havia obtido o empenho
(autorização para gasto) de R$ 639,4 mil referentes a duas emendas feitas por
ele ao Orçamento de 2019 quanto ainda era deputado federal, no ano passado.
Ambas eram direcionadas para compra de equipamentos para exames no Hospital
Naval Marcílio Dias, comandado pela Marinha, no Rio.
As liberações colocavam o presidente no topo do ranking das
chamadas emendas parlamentares impositivas empenhadas até o momento – cada
parlamentar tem direito a direcionar R$ 15,4 milhões para despesas e
investimentos. As liberações beneficiavam apenas nove políticos, no valor total
de R$ 2,2 milhões. O ex-senador Cristovam Buarque (PPS-DF) aparecia em segundo
na lista, com R$ 310,4 mil empenhados.
Os recursos começaram
a ser liberados pelo governo em 26 de março, após uma série de críticas de
parlamentares sobre a demora na execução das emendas deste ano. Três dias
depois, porém, Bolsonaro editou um decreto congelando R$ 29,5 bilhões do
Orçamento para cumprir a meta fiscal do governo.
A medida atingiu mais de 15 áreas, principalmente os
ministérios da Educação e da Defesa e as emendas parlamentares. No dia 3 de
abril, mais da metade das emendas que já haviam sido empenhados foi anulada.
Além das emendas de Bolsonaro, também foram suspensas
indicações no valor de R$ 282,8 mil feitas pelo senador Romário (Pode-RJ), R$
150 mil do deputado Marcelo Matos (PSD-RJ), R$ 111 mil da deputada Norman Ayub
(DEM-ES) e R$ 100 mil do senador Major Olímpio (PSL-SP). Escaparam do corte
emendas de apenas quatro parlamentares: Cristovam Buarque e os deputados Erika
Kokay (PT-DF), Edio Lopes (PR-RR) e Carmen Zanotto (PPS-SC), totalizando R$
939,8 mil.
Segundo a Secretaria de Governo, no entanto, o
contingenciamento poderá ser revisto caso a arrecadação prevista na lei
orçamentária se concretize.
Ritmo lento
Mesmo antes do congelamento de recursos, o volume de
liberação das emendas era considerado baixo e alvo de críticas de
parlamentares. Em 2018, por exemplo, o governo Michel Temer já havia empenhado
no primeiro trimestre R$ 359 milhões em emendas individuais, segundo
levantamento feito pela ONG Contas Abertas, que monitora a execução
orçamentária do governo.
Na ocasião, Bolsonaro ocupava a posição 576 do ranking de
parlamentares beneficiados, com R$ 1,1 milhão. Em 2017, os empenhos haviam
atingido R$ 7,5 milhões no mesmo período. E, em 2016, no governo Dilma
Rousseff, ficou um pouco acima, com R$ 7,6 milhões.
O contingenciamento não afetou até o momento as emendas
indicadas pelas bancadas, ainda de acordo com a Contas Abertas. A bancada de
Minas Gerais foi a mais beneficiada até agora, com o empenho de R$ 53,6
milhões; seguida pelas bancadas de Rondônia, com R$ 36,8 milhões; Maranhão, com
R$ 34,9 milhões; Goiás, com R$ 30,5 milhões; e Rio Grande do Sul, com R$ 24,9
milhões.
“O decreto salvou o presidente de uma enorme enrascada.
Ia ser muito difícil explicar para o Congresso e para sociedade em geral que
até março tinham apenas nove parlamentares contemplados com empenho de emendas
e ele (Bolsonaro) era o campeão, com 30% do valor total das liberações. Isso
poderia provocar uma rebelião na Câmara”, afirmou Gil Castello Branco,
secretário-geral da ONG.
(Fonte: Fabio Leite/Estadão Conteúdo)